sábado, 25 de dezembro de 2010

Jesus, muros, grades




Jesus foi o último homem bom a pisar na terra. Com seu exemplo ele conseguiu estabelecer uma nova lei, baseada no amor ao semelhante. Sem dúvida, a teoria revolucionária mais influente de todos os tempos em todo o mundo.
Comemoramos a chegada do aniversário de Jesus. Porém, nunca seguimos o exemplo maior que ele nos deixou.
Vivemos cercados de grades e muros. Cada um quer proteger o que é seu, a sua propriedade. Não nos importamos se na nossa rua tem um mendigo que passa fome ou se aquele muleque que pede trocado no sinal está se acabando no crack. Sequer enxergamos humanidade nestas pessoas, que parecem surgir por geração espontânea em cada esquina das cidades.
Não existe a possibilidade de amarmos verdadeiramente alguém que não consideramos dignos sequer do mínimo respeito como pessoa. Por isso, o mais importante é que construamos muros cada vez mais altos, com cercas cada vez mais cortantes, para que nos dê uma sensação de segurança.
Temos medo daquilo que criamos. Damos consentimento a toda situação grave de desigualdade social que vivemos no Brasil. Nada é absurdo, naturalizamos o abismo social como se fosse inevitável, como se não existisse outras possibilidades. Como disse Foucault, no Microfísica do Poder: "nada mudará na sociedade se os mecanismos de poder que funcionam fora, abaixo, ao lado dos aparelhos de Estado a um nível muito mais elementar, quotidiano, não forem modificados.” 
Nos separamos, assim, do mundo exterior. Construímos fortalezas que separam a nossa casa, onde está a nossa propriedade, do resto do mundo, público. Porém, mesmo dentro do nosso castelo existem santuários inacessíveis aos outros, como nosso quarto, cama, armários, gavetas, geladeira... mesmo aqueles que são nossos convidados, e podem dividir conosco o espaço feudal de nossas casas, por muitas vezes não tem acesso a estes locais. Não se entra no quarto do filho sem tocar na porta, nem se abre as gavetas dos pais ou do irmão sem pedir. O espaço, dentro da casa, é dividido em territórios, e pouca coisa é compartilhada por todos.
Construímos muralhas que separam a casa da rua, e barreiras que separam o nosso pedaço dentro da casa. Numa esfera mais íntima, estamos também preparados para nos defendermos uns dos outros. A competição, a ambição, a não satisfação incentivada por nosso regime consumista e nossos valores deturpados faz com que confiemos em poucas pessoas, ficando assim reféns do próprio medo. Os muros, barreiras e grades só não conseguem nos separar de uma vida assim, totalmente sem sentido.
Estamos sempre presos às convenções sociais: fomos condenados a nos comportar conforme regras estabelecidas muito antes do nosso nascimento. O amor é infinito, mas só é nos permitido amar sexualmente uma  pessoa. Temos livre arbítrio, mas não temos a liberdade de nos vestir ou ter a aparência que julgarmos mais adequada. A liberdade burguesa só pode ser aproveitada por quem tem saldo suficiente no banco.
Enfim, Ele faz 2010 anos hoje. Há 1977 anos foi crucificado. Dizem que ressucitou depois de três dias.
Hoje, matamos seu exemplo a cada dia, sem nenhuma chance de ressurreição. Ninguém se importa com nada que está além de um palmo do seu próprio nariz. Assim, comemoramos o aniversário de quem matamos todos os dias.

Um comentário:

  1. Essa história de que JC se sacrificou para salvar a humanidade perde o sentido observando a época de Natal. Pois não houve salvação alguma. Pelo contrário, o coitado virou produto, quase um protótipo de Mickey Mouse. Todo dia surge uma igreja nova, fazendo a leitura que interessa dos ensinamentos do JC.
    O homem é um bicho individualista. Só se une contra um inimigo comum, ou seja, pelos próprios interesses. Assim, o Natal é a celebração de tudo que, no fim, não somos.

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