domingo, 5 de junho de 2011

Sofativismo ou Revolta de Papel

Era um dia de aula normal da FAFICH. Tenho o costume de sempre me deter em frente aos cartazes que ficam nas escadas. Normalmente tem algo interessante, um show, um cartaz de alguém que perdeu alguma coisa, enfim... desta feita, porém, algo me chamou a atenção: um cartaz com os dizeres "todo apoio à guerra popular na Índia, contra o Estado fascista indiano" entre outras coisas. Fico imaginando se uma pessoa, num nível elementar de pensamento crítico, pensa mesmo em apoiar uma guerra popular. Isto porque, inúmeros exemplos na história mostram que milhares de vidas são perdidas em conflitos assim, e que se a parte mais fraca ainda consegue a vitória, seu comandante se mostra, geralmente, ainda mais assassino que seu antecessor. A sede por poder e a sensação de onipotência tomam conta dos ditos revolucionários, que se voltam contra o povo que os apoiaram.
Fico imaginando também se a pessoa que apóia esta guerra popular, ou qualquer outra guerra, seria capaz de sair do conforto da sua caminha na zona sul para ir pegar em armas em qualquer desses lugares. Não, acho que não. Indianos, somalis, pessoas de Uganda. Peguem nas armas para mim. Matem-se. Assistirei todos os dias o Jornal Nacional. E apoiarei vocês em pensamento.
Esta profunda inversão da ordem lógica das coisas atinge boa parte da população jovem do país, e a internet é um dos locais mais privilegiados para a observarmos. Por exemplo: campanhas como "doe um fone de ouvido para um funkeiro" ou "contra o preço da gasolina" fazem muito sucesso na rede. Ninguém vai pra rua protestar contra a precariedade da educação no Brasil, que leva à falta de cidadania, que pode levar ao não respeito aos direitos alheios e aí sim à dita falta de noção dos funkeiros em incomodar a pobre classe média com seu gosto musical duvidoso.
O metrô de Belo Horizonte liga o nada a lugar nenhum sem passar pelo centro. De moto, gasto 20 minutos de casa até à FAFICH. De ônibus, pelo menos 1h40min. A passagem é caríssima, e a qualidade é péssima. Mas, a classe média quer andar sozinha no seu carro. E a gasolina está absurdamente cara. E agora? Não vamos nos manifestar pela melhora do transporte coletivo, até porque ele é coletivo, e assim engrossar o coro da maioria da população. O preço da gasolina é o maior problema. E por isso, faremos uma campanha no facebook.
Uma pessoa com a inteligência menos favorecida que ler este post certamente me chamará de reacionário, ou dizer que eu sou contra as manifestações democraticamente legítimas de uma parcela da população. E que pelo menos campanhas virtuais são algum movimento, enquanto eu, edinho, apenas aceito o que me é imposto sem fazer nada, e ainda criticando aqueles que tentam.
Responderia a esta pessoa que eu, edinho, poderia estar fazendo outras coisas da minha vida, ter escolhido outra profissão. O que me faz continuar sendo professor, e assim estar na linha de frente na verdadeira guerra pela qual o Brasil passa, é a sensação de sair de casa cedo por uma causa. Não estou na frente do meu computador esperando as coisas melhorarem.
Talvez andar sozinho no carro seja mais importante que salvar as próximas gerações brasileiras da mediocridade pela qual a minha geração passa. Mas essa é minha guerra. E a batalha é diária, e começa com cada sinal, às 7:00.

3 comentários:

  1. Concordo plenamente! Dia desses li um texto muito interessante sobre o Avaaz (a tal organização que promete mudar o mundo com abaixo-assinados virtuais) que de alguma forma toca na mesma questão que você tratou.
    http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/o-risco-avaaz

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  2. Excelente texto, trata de um aspecto complementar ao que eu falo aqui. O cyberativismo esvazia as manifestações de verdade, com a sensação de que apenas assinar uma petição on-line já é fazer sua parte. Porém, o que trato no post é de geral que tem lutado, do conforto de suas casas, por causas que eu considero logicamente invertidas. Vai sair com o nome de neguinha, mas quem escreve sou eu, edinho.

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  3. É, prezado Edson, o senhor toca em pontos frágeis, delicados mesmo, dessa nossa nova "consciência jovem". O ativismo virtual, me parece, preenche perfeitamente o espaço para "engajamento" que a juventude dos 140 caracteres se permite. Enquanto se planeja viagem de "mochilagem" para a Europa, faz algumas mobilizações internéticas, contra os "absurdos sociais".
    O conceito de classe média perdeu a razão de ser - ou, na verdade, nunca disse respeito a algo palpável. Mas, é irresistível mobilizá-lo: estamos diante de uma imensa classe média, sedenta por englobar mais grupos. Por isso, oremos.

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